Ao nascer uma mãe nascem também as mais complexas emoções, assim como as excessivas cobranças.
Devemos ser zelosas com o bebê e não devemos deixar de nos cuidar, devemos cuidar integralmente da criança mas precisamos trabalhar fora.
Devemos abdicar da vida que passou, escolher uma nova forma de viver e romper radicalmente com tudo que esteja distante do que foi idealizado como a maternidade perfeita.
Para mim, uma mulher em recuperação, as ruminações em torno da maternidade são diárias. De hora em hora me deparo com alguma autocrítica.
“A maternidade deve ser uma das mais lindas experiências que podemos viver.” Essa máxima poderia até se encaixar em um mundo onde não perdemos nosso senso comunal, onde as jornadas de trabalho são justas e equitativas, assim como o cheque mensal, onde vibramos igualdades e não estamos perdidas na imensa sobrecarga demandada para desempenhar o papel de mãe.
Em um mundo onde a licença maternidade não dura mais que alguns meses seria injusto exigir que todas as mulheres correspondam às ideais expectativas de uma sociedade que tende a nos exaurir.
Comungo com aquelas que apesar das limitadas opções, lutam com unhas e dentes por sua prole, mas comungo da mesma forma com aquelas que muitas vezes simplesmente não podem. Não podem atender aos pedidos e desejos incansáveis, de um modelo de vida enlatado e injusto.
Somos essas que para além da maternidade, lidamos com questões internas, conflitos e necessidade de enfrentamento diário de nós mesmas.
Nós que achávamos em uma garrafa nosso alívio, sentíamos falta do sentimento de comunidade. A solidão é um lugar comum na vida de um alcoólico, e quando se trata de uma mulher, aprofunde a métrica três vezes. Rotina doméstica, sobrecargas diárias e ajuda escassa, o combo perfeito para amargurar a solidão em um copo.
As pressões da sociedade para corresponder às expectativas da maternidade perfeita podem nos levar a lugares obscuros. A sobrecarga de responsabilidades, a falta de apoio e a sensação de isolamento levava-nos a procurar alívio no álcool.
Esse modelo socioeconômico, baseado na lógica do capital, nos assegura que o melhor caminho é o da individualização e foco na produção. Submetendo-nos a uma prisão solitária, procuramos dia após dia preencher nossos vazios com o que a publicidade nos oferece. Buscamos incansavelmente sanar nossas dores consumindo coisas, produzindo, adoecendo nossos corpos e no final só procuramos alívio.
É importante porém, perceber, que a nossa força e existência vão além da nossa maternagem, de nossas rotinas diárias exaustivas e dessas caixas que tentam nos colocar.
Re(e)sistimos quando nos unimos a outras mulheres para falar sobre nossas dores, dificuldades, acertos. Enfrentamos esse modelo que aprisiona e isola quando resolvemos por abraçar outras mulheres, ouvir suas histórias, chorar junto com elas, chorar também nossas próprias dores e prontamente receber acolhimento.
Re(e)sistimos quando aceitamos a coletividade e a união ao invés dos espaços de exclusão que ainda nos são relegados. Não é fácil ressignificar essa nossa existência, mas estamos vendo isso acontecer dia após dia, um dia de cada vez.
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