“A importância da terapia no tratamento do uso nocivo de álcool entre mulheres”
- Natana Magalhães
- 27 de ago.
- 3 min de leitura
Para celebrar o Dia da Psicóloga e do Psicólogo, convidamos a psicóloga Claudia Leiria para uma conversa sobre a importância da escuta qualificada e do acolhimento psicológico no cuidado com a saúde mental de mulheres que enfrentam o uso nocivo de álcool.
Sabemos que, para muitas mulheres, interromper o consumo de álcool vai muito além da força de vontade: envolve traumas, sobrecargas, mudanças de hábitos, sofrimento emocional, estigmas e ausência de redes de apoio. Nesse contexto, a atuação de profissionais da Psicologia se torna um ponto de virada possível.
Com sua trajetória como psicóloga, especialista em Dependência Química e Terapia Familiar Sistêmica, além de cofundadora da Associação Alcoolismo Feminino, Claudia traz contribuições importantes para dar visibilidade ao tema e ampliar o entendimento sobre o cuidado terapêutico.
AF - Com base na sua experiência clínica e nos relatos que você tem escutado ao longo do trabalho na AF, quais têm sido, na sua avaliação, os principais motivos que levam as mulheres a buscar o álcool e seus impactos psicológicos?
Claudia Leiria - As mulheres, assim como os homens, podem fazer uso de álcool por motivos variados. Porém, existem diferenças nos padrões de consumo entre homens e mulheres que estão relacionados não apenas às diferenças biológicas, mas também a fatores sociais, culturais e ambientais e a fatores neurobiológicos complexos e específicos.
As mulheres frequentemente começam a consumir álcool para “aliviar” problemas de saúde mental pré-existentes, como Transtorno do Humor (mania e depressão), de Ansiedade (pânico, fobias e transtorno do estresse pós-traumático) e Transtornos Alimentares.
Além dos impactos físicos e sociais, que são muitos, como impactos psicológicos, temos o estigma social, sentimentos de culpa e vergonha, todos os tipos de violência, surgimento e/ou piora dos Transtornos Mentais, abandono, conflitos relacionais (principalmente familiares), baixa autoestima, solidão, isolamento e prejuízo das habilidades sociais.
AF - Por que o acompanhamento psicológico é tão importante para mulheres que desejam parar de beber, mas encontram dificuldades para isso?
Claudia Leiria - Por toda sua complexidade, o tratamento do TUA (Transtorno por Uso de Álcool) envolve uma equipe multidisciplinar, pois é o modo mais eficaz de auxiliar a paciente nas suas diversas demandas.
O acompanhamento psicológico é fundamental desde a abordagem dessa mulher, construindo um vínculo terapêutico de confiança, psicoeducação, utilização de técnicas psicoterápicas adequadas a cada caso, trabalhando prevenção de recaída, ajudando na modificação de hábitos e na construção e manutenção de uma vida livre de álcool.
AF - A partir da sua abordagem como terapeuta familiar sistêmica, quais dinâmicas familiares, relacionais ou socioculturais você identifica com maior frequência como gatilhos ou como parte do ciclo dessa doença?
Claudia Leiria - As relações, sejam elas de qualquer ordem, podem significar fatores de risco ou de proteção para a mulher com TUA.
Após ficar abstinente do uso de álcool, ela vai se encontrar novamente na situação anterior ao uso, com os mesmos problemas e as mesmas dificuldades. A tendência a voltar ao consumo é sempre grande e fica maior quando se depara com velhas dificuldades e não evita situações de risco para ela.
Por exemplo, no caso da família, ela pode ser um problema ou uma solução, tanto durante a progressão do TUA, quanto no processo de tratamento. Familiares facilitadores, com limites frágeis, podem contribuir para a manutenção do adoecimento.
É fundamental que os membros da família também busquem ajuda através de grupos de mútua ajuda, terapia individual ou familiar. As mudanças do estilo de vida não se limitam apenas à mulher com TUA.
AF - Muitas mulheres relatam sentir vergonha de buscar ajuda. Como o acolhimento sem julgamento, como o que a AF oferece, pode fazer diferença no processo de busca por tratamento?
Claudia Leiria - Com certeza, o preconceito, o medo de se sentir julgada e o estigma social são as maiores barreiras para a mulher buscar ajuda. Durante muito tempo, os serviços oferecidos para o tratamento do TUA eram majoritariamente masculinos. Ainda hoje, existe pouca oferta de serviços especializados que contemplem as questões de sexo, gênero e seus determinantes. Este público requer abordagens diferenciadas e personalizadas que se ajustem às suas demandas.
A AF oferece um serviço que procura atender às especificidades individuais e grupais do universo feminino, reduzindo as barreiras para iniciar e manter o tratamento.
Através de Grupos de Partilhas, também chamados de Grupos de Trocas, realizados diariamente; Grupos Temáticos (Empoderamento Feminino, Prevenção de Recaídas, Sexualidade, Maternagem, Mulheres em situação de violência, Codependência, Educação nutricional, Solta a voz de mulheres negras, LBTQIAPN+, Familiares), além de Psicoterapia individual e Tratamento psiquiátrico de forma online, buscamos oferecer suporte amplo.
Também, através de uma comunidade virtual, oferecemos um espaço seguro e acolhedor para compartilhar experiências. Assim, buscamos abarcar as muitas dimensões do universo feminino.
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